Verdadeiras lições sobre vida, morte e Brasil. Para as pessoas comuns, não importava se Império ou República, a vida só seguia, como segue até hoje. Por mais que fosse o fim dos imperialistas e fim da dureza dos coronéis, a República continuou permitindo a continuidade das mesmas práticas, como, por exemplo, o curral eleitoral, é muito interessante na leitura revisitar a História do Brasil através das caçadas criadas pelo João Gilberto.
“Peões também jogam xadrez, e às vezes lhes cabem jogadas decisivas, até um xeque mate.”
“As terras não tinham dono nem ocupação, as sesmarias eram tituladas no papel, a região do Triângulo nem sabia direito se era Minas, São Paulo ou Goiás, de tanta gente de tanto lugar diferente ali chegando e acampando.”
Tonho Pólvora partiu para o Desemboque com o objetivo de trabalhar, ter sua própria fazenda e fazê-la crescer, ele é um homem simples, não pensa em ter fortuna, pensa na terra, no gado. Ao lado dele vão Zé Brilino e Zé Anjo, o primeiro um velho sábio e o segundo uma espécie de aprendiz. Eles formam uma família fora dos padrões, onde Zé Brilino sempre tem muitas lições seja sobre cavalos, burros ou mesmo sobre a vida. Foi incrível aprender com ele, parecia um avô nos contando suas histórias. Deixo uma de suas lições:
“Tem povo que é igual a dourado e piapara, cheio de escama, de força e valentia, vem logo à flor da água, pula para fora, afunda feito doido, gasta a energia, aí entrega rápido para morrer. Tem gente igual a peixe de couro, Zé Anjo. Vive mais por baixo, experimenta a isca, anzol e pescador, mesmo ferrado busca defesa em ramo de enrosco, parece entregar para distrair, logo afunda de novo, até para morrer na canoa o bicho é demorado. Na pescaria da vida, põe tendência nisso. Veja e estude o peixe que vai pescar. O jeito e o trato variam, se for de couro ou de escama...”
Em São Paulo José Antônio preparou e efetuou um golpe na empresa onde trabalhava, ele fazia qualquer coisa para ter fortuna, qualquer coisa. Com o objetivo de ser rico e poderoso ele se muda para o interior, encontra no Desemboque um local para criar um entreposto comercial. Ele vai ficando mais rico, mas nunca satisfeito. Sempre precisa de mais dinheiro, mais poder a sua única moral é favorecer a si mesmo.
Manuel Crispim, um policial-caçador, nunca perdia um bandido, tinha um senso de justiça muito bem apurado. A vida lhe dá muitas cicatrizes, ele se torna o homem de uma missão: encontrar um bandido que roubou uma empresa em São Paulo e desapareceu pelo Brasil, Crispim vai atrás dele não se importando se nessa caçada ele perca toda a sua própria vida.
Coronel Macedo, a figura que representava desde de polícia, juiz e executor da sentença no Desemboque, estava perdendo suas forças, imperialista via os seus anos de glória ficando para o passado, tudo que ele deseja são bons casamentos para suas filhas Mariita e Ana, ambas que são muito diferentes, Mariita ama festas e flertar com os rapazes, enquanto Ana sabe como comandar a fazenda (melhor até que muitos homens).
“No interior os fatos políticos se passaram de forma menos sentida, anestesiada pela distância, deficiência de informação e comunicação. Muita gente aplaudiu a República sem saber o que ela era ou significava, apenas pelo que dela diziam os novos arautos da fauna política que iria progressivamente crescer e dominar o país.”
O Desemboque se torna um palco onde a vida de todos os personagens vai se entrelaçar, ora sendo caça ora sendo caçador.
A vida no interior do país no final do século XIX era uma vida sofrida, não havia lei ou Constituição que fosse forte o suficiente para assegurar a vida, o mais forte ou o mais bem armado levava vantagem, seja a arma uma pistola ou ameaças.
“Assim se faz a história. Nem sempre dos fatos queridos e planejados, muitas vezes da sorte ou acaso, ou do que árabes e fatalistas chamam de destino”
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