segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Resenha: A Armadura da Luz / Ken Follett

A História, a com H maiúsculo, aquela que a gente aprende na escola, acontece independentemente das pessoas comuns. Pessoas como eu e você que vivemos o dia a dia, sem ter um papel importante em decisões que podem mudar o curso da História. Você já pensou nas pessoas como eu ou você, do passado? Como que elas viveram uma execução de um rei, o surgimento de uma nova tecnologia ou uma revolução?

Ken Follett nos leva até essas pessoas. Tendo a História como plano de fundo, vamos observando a vida de pessoas comuns, as vezes também observando os poderosos, de vez enquanto a vida tem essas curvas, quando uma pessoa comum fica diante de alguém que teve seu nome escrito nos livros. O fato é que ao longo do ‘Armadura da luz’, vamos vendo as consequências da História que já conhecemos, na nova história, desses personagens ficcionais que poderiam ter vivido essa época.

Quando eu vou explicar um livro do Follett para alguém que não conhece ou nunca ouviu falar, eu digo que é uma novela. Tendo vários núcleos de personagens, uma série de sensações e emoções, a gente encontra tudo neles, amor? Temos. Bons vilões? Temos. Reviravolta? Temos. Eu sempre aprendo muito lendo Follett, aprendizados para a vida. Através de personagens que conhecemos as vezes bem jovens, outras no final da vida, mas que nos ensinam que tudo nessa vida tem alguma consequência seja para o bem ou para o mal, amar alguns personagens e torcer por eles, enquanto temos raiva de outros é bem habitual lendo Follett.

“O amor é a melhor coisa do mundo de se ter, e a pior de se perder.”

Com um total de 631 páginas, o livro é dividido em 7 partes:
  • A Máquina de fiar (1792 a 1793)
  • A Revolta das donas de casa (1795)
  • A Lei da Associação (1799)
  • Recrutamento forçado (1804 a 1805)
  • A Guerra Mundial (1812 a 1815)
  • A Batalha de Waterloo (16 a 18 de junho de 1815)
  • A Paz (1815 a 1824)

Vou falar um pouco dos personagens principais, apenas alguns que destaco:

💫Kit: O pequeno e esperto Kit foi obrigado a ir trabalhar com apenas 6 anos de idade. Seu pai morreu depois de um acidente ocasionado por um erro de um nobre. Vamos acompanhar o seu desenvolvimento, até ele ter um papel relevante tanto na revolução industrial de Kingsbridge quanto na vitória na Batalha de Waterloo.

💫Sal: mãe de Kit, uma mulher forte e guerreira. Ela vai ter a vida que conhecia acabar, quando é obrigada a sair de sua própria casa. Vai para Kingsbridge em busca de trabalho que possa se alimentar e alimentar seu filho. Ela nunca desiste dos seus ideais e de quem ela ama. Mesmo a vida fazendo com que ela passe por muitos desafios, ela nunca perde a esperança e sempre é uma voz ativa dos trabalhadores.

💫Amos: ele herda os negócios do pai, acreditando que agora poderia colocar tudo da forma que gostaria e descobre que só herdou dívidas. Com o tempo, ele consegue ser o primeiro a levar uma máquina para Kingsbridge. Seu ponto fraco é ser apaixonado por uma mulher que não quer nada com ele.

💫Will e Roger: São irmãos totalmente diferentes, nobres, receberam estudos, mas enquanto Roger é educado e pensa nos outros, Will é rude, egoísta e mimado. Roger, porém, tem um vício em jogos que vai colocar a sua vida em risco.

💫Arabela e Elsie: Mãe e filha do bispo. As duas são muito respeitadas por todos. Arabela tem a felicidade em comprar roupas e em ter tido sua filha, enquanto Elsie vai conseguir abrir uma escola dominical para as crianças humildes de Kingsbridge. A vida das duas vai mudar muito, e elas vão perceber que a felicidade pode estar onde menos esperavam.

💫Spade: ele é um patrão que houve os trabalhadores, um personagem muito interessante que consegue mostrar que um diálogo é possível. O amor proibido vai colocar ele em apuros.

“Como acontecia com grande frequência, Spade viu as coisas de outro modo.

- No mesmo dia em que o rei francês foi guilhotinado, nós aqui em Kingsbridge enforcamos Josiah Pond por ter roubado uma ovelha. Foi assassinato também?”

💫Hornbeam: o nosso maior vilão. Quando a gente pensa que ele se superou, ele sempre tem uma carta na manga para colocar seu interesse em primeiro lugar, em detrimento de qualquer coisa, mesmo que seja a vida de pessoas inocentes.

Vamos seguindo a vida deles, vidas que vão ser impactadas por grandes acontecimentos históricos. A Revolução Francesa, mostra que há outros caminhos além da monarquia, Napoleão está cada vez mais aumentando o tamanho do seu Império, a Revolução Industrial se faz presente, novas invenções que chegam para aumentar a produção, enriquecendo alguns e para tirar empregos daqueles que faziam trabalhos manuais, temos o advento do Ludismo, a partir do qual os trabalhadores se uniram para quebrar as novas máquinas e temos a grande Batalha de Waterloo.

“Os soldados têm dificuldade para retomar a rotina. Acostumaram-se com a ideia de que a vida não vale grande coisa. Mataram homens, viram amigos morrerem. Essas experiências embotam a compaixão. O único jeito de eles suportarem é ficando insensíveis. Eles não conseguem simplesmente voltar a ser sujeitos normais.”

Imagina passar toda a sua recém adquirida vida adulta durante uma guerra? Guerra que podia obrigar você a ir pro campo de batalha, guerra que encarecia todos os produtos; ao mesmo tempo em que diminui a procura pela compra de artigos de luxo, é um efeito em cascata. Uma guerra que as pessoas comuns nem entendiam muito bem o motivo de lutar. (a diferença pros revolucionários, que lutavam em prol de um ideal).

“As más lembranças envenenam as boas.”

Uma das partes que mais me impactaram foram as cenas de batalhas, todo o sofrimento da guerra. As cenas são muito bem detalhadas, desde o desgaste, o medo, até mesmo ao fato de que quando a luta começa, você não pensa em mais nada, apenas matar o inimigo. Além do importante papel das mulheres no campo de batalha, elas acompanhavam seus maridos, e iam em busca de alimentos ou mesmo buscavam os corpos sem vida de seus amados para um enterro digno. Dá para se sentir no front durante a leitura.

O rancor e ódio são sentimentos que se guardados só fazem mal, um dos personagens, aquele que faz a gente ter vontade de entrar no livro para socar ele devido todas as maldades que ele faz, se vê diante de uma reviravolta que o faz questionar todas as suas atitudes anteriores, depois de proliferar ódio e rancor durante a vida inteira, ele nem sabe o que fazer quando o tratam de forma diferente, a lição que esse personagem nos dá é incrível. Nunca vale a pena nutrir esses sentimentos, só são pesos em nossas vidas.

Em Kingsbridge:

💫As máquinas e os operários: os trabalhadores que sempre foram a força de trabalho se veem diante da inovação das máquinas, alguns se adaptam, outros optam por afirmar que os inimigos são as próprias máquinas e temos em Kingsbridge adeptos ao ludismo.

“- Bom, os ingleses supostamente têm o direito de ter as opiniões que quiserem.

- Quando dizem isso, estão se referindo aos fidalgos. Ninguém acredita que pessoas como nós devam ter opiniões.”

💫As leis severas, o medo dos nobres de que os operários se unissem, e os julgamentos imparciais: sentenças de servir, trabalhos forçados, banimento pra Austrália ou morte em praça pública. Taxas devido a guerra, pão cada vez mais caro, falta de trabalho, os trabalhadores tentam se unir, mas a lei proíbe sindicatos. A vida cotidiana está um caos.

💫Os irlandeses: novos moradores chegam e povoam o outro lado da famosa ponte de Kingsbridge.

💫Catolicismo, anglicanismo e metodismo: o tempo das brigas religiosas já passou, agora em Kingsbridge se vive uma harmonia que se dá por cada um ficar no deu próprio quadrado, porém o anglicanismo ainda detém o maior poder, durante um julgamento, ser metodista poderia pesar a balança negativamente para quem estava sendo julgado.

“Por causa dessa guerra sem sentido, estamos tendo que lutar para sobreviver. E os operários estão ficando cada vez mais revoltados.”

Tem momentos da leitura que eu fiquei vidrada sem conseguir largar, em outros precisei dar uma pausa para respirar, seja pelas maldades inacreditáveis ou por ele a dureza do front da guerra.

Ler Follett é muito prazeroso para mim, os personagens e cenas ficam comigo para sempre. Outro dia comentei num post da editora Arqueiro no Instagram que já li tanto sobre Kingsbridge que sei até andar pelas ruas e é verdade, a ponte onde tudo começou, a Ilha dos Leprosos, a praça do mercado, o Hospital da Caris, os moinhos, a Rua Alta onde itens nobres são vendidos, a Hospedaria do Sino, e o novo Café, o lado onde os trabalhadores moram, a Mansão Willard e lá no fundo a catedral, palco de tantos acontecimentos. Foi incrível demais passar vários dias em Kingsbridge e viver a História ao lado desses personagens.

“Como ele havia aprendido, porém, assim era a vida. As coisas nunca saíam exatamente como você esperava.”


Confira as resenhas dos outros livros ambientados em Kingsbridge:


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